Mitos de origem
Data de publicação: 16/02/2016
Mitos de origem nos textos sagrados escritos
A pergunta sobre a origem da vida e do mundo é uma questão existencial e requer soluções de ordem religiosa. O ser humano, enquanto ser capaz de reflexão, elabora respostas que, no fundo, tentam decifrar o sentido da existência diante do mundo e de um poder criador. Ao longo do tempo, várias foram as formas artísticas de tais respostas decifradoras: pinturas rupestres, desenhos em vasos de barro, monumentos, miniaturas de marfim, textos míticos, filosofias, cosmovisões etc.
Mitos, paradigmas e significados para a vida
Uma das formas mais eficazes de responder à pergunta pelas origens últimas da vida, do mundo, da humanidade e dos costumes é o mito. O mito é um relato sobre deuses e heróis divinos de tempos antigos, em uma linguagem de grande poder explicativo e simbólico. Quando se fala em mito, deve-se superar o senso comum, de algo não verdadeiro e indigno de crédito. Mitos são histórias consideradas verdadeiras ou sagradas, que se referem à origem de algo e se constituem em paradigmas para as ações humanas dentro da respectiva comunidade. É preciso entender a linguagem das narrativas míticas e as imagens de ser humano subjacentes a tais projeções. Bem o afirma o romeno Mircea Eliade, grande pesquisador das religiões: “Conhecendo-se o mito conhece-se a origem das coisas”. Os mitos são expressões hermenêuticas de culturas específicas e podem conter arquétipos comuns a toda a humanidade, isto é, temas repetidos com pequenas diferenças em várias narrativas míticas.
Há diferentes classificações de mitos. Aqui, podem-se distinguir três: mitos teogônicos, cosmogônicos e civilizatórios. O primeiro conta a origem de deuses e divindades nos tempos imemoriais. O último narra a origem de usos e costumes dentro de uma determinada cultura, como hábitos alimentares, vestuário ou comportamento. Os mitos cosmogônicos tratam essencialmente da origem do cosmo. Os diversos mitos nem sempre aparecem na forma pura proposta nas classificações dos estudiosos. Mas sempre procuram narrar a origem de algo existente.
Mitos cosmogônicos
Quase todas as religiões conhecidas narram a origem mítica do Universo e da humanidade. Na antiga Babilônia, havia o mito de Enuma Elish, que é um misto de mito teogônico, cosmogônico e civilizatório, pois narra a origem dos deuses, sendo Marduk, a divindade protetora, e como os deuses criaram o ser humano, indicando, já na origem mítica, formas de comportamento, como o trabalho incessante, quase escravo. Na China, o mito do Ovo Cósmico fala de um tempo em que só havia o caos, encerrado na forma de um ovo de galinha, no qual os princípios fundantes, Yin e Yang, o masculino e o feminino, entraram em conflito e, quebrando o ovo, iniciaram a criação com o surgimento de PanGu, o primeiro ser, encarregado de manter separados o céu e a terra. Cansado, PanGu morreu e, das pulgas que habitavam seu corpo, nasceram os seres humanos. Na Grécia, conforme o relato de Hesíodo, o cosmos surgiu de elementos preexistentes. O Hino do Homem Primordial, nos Vedas da Índia, fala de Prajapati, o senhor dos seres – mais tarde identificado com o deus Brahma – como homem cósmico, cujo corpo é sacrificado e do qual surge a variedade do mundo das formas. O mito, enquanto linguagem humana, é sempre veículo de expressão das convicções profundas existentes em determinada cultura.
Mito na Bíblia
Nas primeiras páginas da Bíblia, o povo de Israel também expressou sua fé e suas convicções mais profundas pela linguagem mitológica. Porém, dizer que o texto de Gênesis 1 é um mito é uma afirmação que levanta questionamentos, porque a Bíblia é um texto sagrado escrito, entendido como revelado, por inspiração verbal divina. Chocam-se, aqui, o conceito de revelação e a noção de mito e cultura.
Muitas vezes, na perspectiva cristã, os mitos são colocados em nível inferior à revelação. No caso dos textos bíblicos, eles se “tornaram” sagrados ou canônicos após um longo processo de tradição, cuja base é a articulação da fé como resposta humana a um desafio histórico ou a uma interpelação divina em processos históricos. Na formação das tradições bíblicas que se tornaram canônicas, há um sincretismo. Os autores sagrados souberam aprender das culturas e das religiões do entorno de Israel. Além disso, as narrativas em linguagem de estrutura mítica fazem parte dos conjuntos das religiões. A linguagem mítica é constitutiva da própria religião.
O mito de origem hebraica, registrado no começo do livro de Gênesis, é uma produção cultural dos israelitas, que souberam aprender dos povos do entorno cultural. É possível que as origens dessa narrativa possam ser alocadas para o tempo do exílio, quando uma parte do povo hebreu foi deportada para a Babilônia. Naquele contexto deu-se um confronto cultural e religioso com a religiosidade babilônica, cuja expressão mítica das origens era o Enuma Elish. Partes do mito babilônico foram recontadas na perspectiva hebraica. Assim, o texto se constituiu em uma narrativa “contra cultural”, isto é, um grupo cultural dominado reagiu contra os dominadores, assumindo e modificando partes essenciais da religião dominante. Mais tarde, o texto foi reelaborado para abrir a coleção de textos sagrados do judaísmo, a Torah. O cristianismo, na herança judaica, professa suas crenças sobre as origens do cosmo em conformidade com este texto e de forma similar procede o islamismo.
O conteúdo bíblico nos apela no tempo presente
O texto de Gênesis 1 destaca conteúdos importantes na perspectiva mítica. Realça a origem do Universo na ação criadora do Deus dos hebreus, Yahveh ou Elohim. Este Deus cria através da palavra, ordenando o caos preexistente. As obras do Criador são descritas numa estrutura de sete dias, sendo cada dia contemplado com a criação de um elemento. A obra do primeiro dia é a luz; no quarto dia são criados os astros e as estrelas; no sexto dia, os animais domésticos e o ser humano. E, no sétimo dia, o Criador descansa e abençoa este tempo. A própria estrutura literária de sete dias prescreve um ritmo de tempo a ser observado pelos hebreus em imitação ao Criador: seis dias de trabalho seguidos de um dia de descanso, o shabbat.
O ser humano é criado como imagem e semelhança e recebe do Criador a incumbência do domínio e do cuidado da criação. É importante resgatar este domínio na forma de cuidado e responsabilidade ecológica no mundo em que vivemos.
* Haroldo Reimer
Doutor em Teologia, pastor da Igreja Luterana e professor na Pós-Graduação em Ciências da Religião, da Universidade Católica de Goiás, em Goiânia (GO).
A maçã da discórdia
Essa expressão é usada em referência à Bíblia, porém os relatos bíblicos não falam de maçã e sim de fruto (cf. Gn 3,1-6). Então, de onde surgiu a maçã? Existem menções a ela em narrativas de outros povos.
Na mitologia grega, durante uma festa de casamento no Olimpo, a morada dos deuses e deusas, Érida, a deusa da discórdia, enviou às convidadas uma maçã de ouro, na qual estava escrito: “para a mais bela.” Foi o começo da rivalidade entre as deusas.
Na Escandinávia, a deusa Idun possuía a maçã da imortalidade. Quem a comesse se tornaria um deus. Loki, o pai da mentira, que tinha o poder de assumir a figura de uma serpente, atraiu a deusa Idun para o meio das árvores, na floresta, e lhe roubou a maçã, o que privou os deuses do dom da imortalidade e trouxe o sofrimento e a velhice.
Entre os celtas, da Bretanha, a ilha de Avalon era o jardim das maçãs. Quem nele entrasse e provasse do fruto se tornaria imortal.
Livro
As linguagens da experiência religiosa – Uma introdução à fenomenologia da religião
José Severino Croatto – Coleção Religião e Cultura, cód. 50011-9
Paulinas Editora
Mito e interpretação da realidade, mito e cosmovisão, mitos de origem, mito e cultura, mito e história, mito e rito e do mito à doutrina são os temas desta obra multidisciplinar, indispensável no estudo da religião como fenômeno cultural.
DVD
A criação de Deus – Teologia da Criação
DVD série Espírito e Vida, cód. 17048-8 – Professor Luiz Carlos Susin
Paulinas Multimídia
Um olhar sobre o Universo e o ser humano sob o prisma da tradição bíblica e da ciência, iluminado pela revelação cristã.
A pergunta sobre a origem da vida e do mundo é uma questão existencial e requer soluções de ordem religiosa. O ser humano, enquanto ser capaz de reflexão, elabora respostas que, no fundo, tentam decifrar o sentido da existência diante do mundo e de um poder criador. Ao longo do tempo, várias foram as formas artísticas de tais respostas decifradoras: pinturas rupestres, desenhos em vasos de barro, monumentos, miniaturas de marfim, textos míticos, filosofias, cosmovisões etc.
Mitos, paradigmas e significados para a vida
Uma das formas mais eficazes de responder à pergunta pelas origens últimas da vida, do mundo, da humanidade e dos costumes é o mito. O mito é um relato sobre deuses e heróis divinos de tempos antigos, em uma linguagem de grande poder explicativo e simbólico. Quando se fala em mito, deve-se superar o senso comum, de algo não verdadeiro e indigno de crédito. Mitos são histórias consideradas verdadeiras ou sagradas, que se referem à origem de algo e se constituem em paradigmas para as ações humanas dentro da respectiva comunidade. É preciso entender a linguagem das narrativas míticas e as imagens de ser humano subjacentes a tais projeções. Bem o afirma o romeno Mircea Eliade, grande pesquisador das religiões: “Conhecendo-se o mito conhece-se a origem das coisas”. Os mitos são expressões hermenêuticas de culturas específicas e podem conter arquétipos comuns a toda a humanidade, isto é, temas repetidos com pequenas diferenças em várias narrativas míticas.
Há diferentes classificações de mitos. Aqui, podem-se distinguir três: mitos teogônicos, cosmogônicos e civilizatórios. O primeiro conta a origem de deuses e divindades nos tempos imemoriais. O último narra a origem de usos e costumes dentro de uma determinada cultura, como hábitos alimentares, vestuário ou comportamento. Os mitos cosmogônicos tratam essencialmente da origem do cosmo. Os diversos mitos nem sempre aparecem na forma pura proposta nas classificações dos estudiosos. Mas sempre procuram narrar a origem de algo existente.
Mitos cosmogônicos
Quase todas as religiões conhecidas narram a origem mítica do Universo e da humanidade. Na antiga Babilônia, havia o mito de Enuma Elish, que é um misto de mito teogônico, cosmogônico e civilizatório, pois narra a origem dos deuses, sendo Marduk, a divindade protetora, e como os deuses criaram o ser humano, indicando, já na origem mítica, formas de comportamento, como o trabalho incessante, quase escravo. Na China, o mito do Ovo Cósmico fala de um tempo em que só havia o caos, encerrado na forma de um ovo de galinha, no qual os princípios fundantes, Yin e Yang, o masculino e o feminino, entraram em conflito e, quebrando o ovo, iniciaram a criação com o surgimento de PanGu, o primeiro ser, encarregado de manter separados o céu e a terra. Cansado, PanGu morreu e, das pulgas que habitavam seu corpo, nasceram os seres humanos. Na Grécia, conforme o relato de Hesíodo, o cosmos surgiu de elementos preexistentes. O Hino do Homem Primordial, nos Vedas da Índia, fala de Prajapati, o senhor dos seres – mais tarde identificado com o deus Brahma – como homem cósmico, cujo corpo é sacrificado e do qual surge a variedade do mundo das formas. O mito, enquanto linguagem humana, é sempre veículo de expressão das convicções profundas existentes em determinada cultura.
Mito na Bíblia
Nas primeiras páginas da Bíblia, o povo de Israel também expressou sua fé e suas convicções mais profundas pela linguagem mitológica. Porém, dizer que o texto de Gênesis 1 é um mito é uma afirmação que levanta questionamentos, porque a Bíblia é um texto sagrado escrito, entendido como revelado, por inspiração verbal divina. Chocam-se, aqui, o conceito de revelação e a noção de mito e cultura.
Muitas vezes, na perspectiva cristã, os mitos são colocados em nível inferior à revelação. No caso dos textos bíblicos, eles se “tornaram” sagrados ou canônicos após um longo processo de tradição, cuja base é a articulação da fé como resposta humana a um desafio histórico ou a uma interpelação divina em processos históricos. Na formação das tradições bíblicas que se tornaram canônicas, há um sincretismo. Os autores sagrados souberam aprender das culturas e das religiões do entorno de Israel. Além disso, as narrativas em linguagem de estrutura mítica fazem parte dos conjuntos das religiões. A linguagem mítica é constitutiva da própria religião.
O mito de origem hebraica, registrado no começo do livro de Gênesis, é uma produção cultural dos israelitas, que souberam aprender dos povos do entorno cultural. É possível que as origens dessa narrativa possam ser alocadas para o tempo do exílio, quando uma parte do povo hebreu foi deportada para a Babilônia. Naquele contexto deu-se um confronto cultural e religioso com a religiosidade babilônica, cuja expressão mítica das origens era o Enuma Elish. Partes do mito babilônico foram recontadas na perspectiva hebraica. Assim, o texto se constituiu em uma narrativa “contra cultural”, isto é, um grupo cultural dominado reagiu contra os dominadores, assumindo e modificando partes essenciais da religião dominante. Mais tarde, o texto foi reelaborado para abrir a coleção de textos sagrados do judaísmo, a Torah. O cristianismo, na herança judaica, professa suas crenças sobre as origens do cosmo em conformidade com este texto e de forma similar procede o islamismo.
O conteúdo bíblico nos apela no tempo presente
O texto de Gênesis 1 destaca conteúdos importantes na perspectiva mítica. Realça a origem do Universo na ação criadora do Deus dos hebreus, Yahveh ou Elohim. Este Deus cria através da palavra, ordenando o caos preexistente. As obras do Criador são descritas numa estrutura de sete dias, sendo cada dia contemplado com a criação de um elemento. A obra do primeiro dia é a luz; no quarto dia são criados os astros e as estrelas; no sexto dia, os animais domésticos e o ser humano. E, no sétimo dia, o Criador descansa e abençoa este tempo. A própria estrutura literária de sete dias prescreve um ritmo de tempo a ser observado pelos hebreus em imitação ao Criador: seis dias de trabalho seguidos de um dia de descanso, o shabbat.
O ser humano é criado como imagem e semelhança e recebe do Criador a incumbência do domínio e do cuidado da criação. É importante resgatar este domínio na forma de cuidado e responsabilidade ecológica no mundo em que vivemos.
* Haroldo Reimer
Doutor em Teologia, pastor da Igreja Luterana e professor na Pós-Graduação em Ciências da Religião, da Universidade Católica de Goiás, em Goiânia (GO).
A maçã da discórdia
Essa expressão é usada em referência à Bíblia, porém os relatos bíblicos não falam de maçã e sim de fruto (cf. Gn 3,1-6). Então, de onde surgiu a maçã? Existem menções a ela em narrativas de outros povos.
Na mitologia grega, durante uma festa de casamento no Olimpo, a morada dos deuses e deusas, Érida, a deusa da discórdia, enviou às convidadas uma maçã de ouro, na qual estava escrito: “para a mais bela.” Foi o começo da rivalidade entre as deusas.
Na Escandinávia, a deusa Idun possuía a maçã da imortalidade. Quem a comesse se tornaria um deus. Loki, o pai da mentira, que tinha o poder de assumir a figura de uma serpente, atraiu a deusa Idun para o meio das árvores, na floresta, e lhe roubou a maçã, o que privou os deuses do dom da imortalidade e trouxe o sofrimento e a velhice.
Entre os celtas, da Bretanha, a ilha de Avalon era o jardim das maçãs. Quem nele entrasse e provasse do fruto se tornaria imortal.
Livro
As linguagens da experiência religiosa – Uma introdução à fenomenologia da religião
José Severino Croatto – Coleção Religião e Cultura, cód. 50011-9
Paulinas Editora
Mito e interpretação da realidade, mito e cosmovisão, mitos de origem, mito e cultura, mito e história, mito e rito e do mito à doutrina são os temas desta obra multidisciplinar, indispensável no estudo da religião como fenômeno cultural.
DVD
A criação de Deus – Teologia da Criação
DVD série Espírito e Vida, cód. 17048-8 – Professor Luiz Carlos Susin
Paulinas Multimídia
Um olhar sobre o Universo e o ser humano sob o prisma da tradição bíblica e da ciência, iluminado pela revelação cristã.
Fonte: Diálogo 43- AGO/ 2006
Postado por: Diálogo Disponível em: http://www.paulinas.org.br/dialogo/pt-br/?system=news&action=read&id=12448
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não entendi absolutamente NADA.........:(:(
ResponderExcluirEu tbm não KKKKKKKK
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