terça-feira, 26 de novembro de 2024

Religiões presentes no Japão

 

Raízes Nativas e Influência Estrangeira

Santuário Ise
Santuário Aramatsuri no Miya, ou Santuário Ise
O mais importante de todos os santuários, o Ise foi dedicado a deusa sol Amaterasu, que alguns acreditam ser a ancestral da família imperial

A história da religião no Japão é marcada por um longo processo de influências e de tradições religiosas. Em contraste com a Europa, onde o Cristianismo suplantou as tradições pagãs locais, a religião local Xintoísmo continuou como parte da vida das pessoas desde os tempos mais antigos até a organização do Estado nos tempos modernos.

Quando o Budismo foi introduzido no Japão no século VI, as crenças Xintoístas e Budistas começaram a interagir. E essa é a característica definidora da religião japonesa. O maior exemplo dessa interação é a teoria de honji suijaku, na qual o kami Xintoísta foi visto como a encarnação de divindades Budistas.

O Confucionismo e o Taoísmo são duas outras religiões “importadas” que desempenharam um importante papel na sociedade japonesa por um período de mais de mil anos. Os preceitos confucionistas tiveram uma influência maior sobre a ética e a filosofia japonesa, no período da formação do Estado (nos séculos VI e IX), e novamente no período Edo (1600 – 1868). Com uma influência não tanto marcante como a do Confucionismo, o Taoísmo no Japão pode ser percebido no uso do horóscopo chinês e em crenças populares como nas adivinhações ou nas ‘direções auspiciosas’.

Xintoísmo

Casamento Xintoísta
Casamento Xintoísta
A celebração do casamento no estilo Xintoísta ainda é comum


A palavra ‘Xintoísmo’, a qual é geralmente traduzida com “o caminho dos deuses”, é escrita com dois caracteres chineses. O primeiro caractere, que é pronunciado como kami isoladamente, significa ‘deus’, ‘divindade’, ou ‘poder divino’, e o segundo caractere significa ‘caminho’ ou ‘trilha’. Com a introdução do sistema de arrozais durante o período Yayoi (300 a.C a 300 d.C.), os rituais agrícolas e festivais que posteriormente se tornaram parte do Xintoísmo começaram a se desenvolver.

Embora a palavra kami possa ser usada para se referir a um único ‘deus’, ela também pode ser usada no coletivo para designar uma miríade de ‘deuses’ os quais têm sido o objeto central do culto no Japão desde o período Yayoi. Os kami são parte de todas as formas de vida e se manifesta em diversas formas. Existem kami na natureza que residem em rochas sagradas, árvores, montanhas, e em outros fenômenos naturais. Existe um clã de kami chamado ujigami, que foi originalmente formado por deidades tutoras de clãs específicos, que geralmente é um ancestral do clã que foi deificado. Existe o ta no kami, ou deus dos arrozais, o qual é adorado durante o tempo das plantações e nos festivais das colheitas. E existe o ikigami, que são deidades humanas. Os kami que mais se assemelha com os deuses segundo o padrão ocidental são as divindades celestiais que residem no Takamagahara (Alto Plano Celestial). Eles são dirigidos por Amaterasu Omikami, a divindade que é venerada no Santuário Ise, o principal santuário Xintoísta.

Em parte como uma resposta a chegada das doutrinas bem estruturadas do Budismo no Japão no século VI, a atuante, porém desorganizada crença nativa, foi gradativamente sistematizada no Xintoísmo. O desejo de impor uma linhagem imperial legítima sob o fundamento religioso e mitológico levou à compilação do Kojiki (Compilação dos Assuntos Antigos) e do Nihon shoki (crônicas do Japão), em 712 e 720, respectivamente. Ao traçar a linhagem imperial até a era dos deuses, esses livros ensinam como os kami Izanagi e Izanami formaram as ilhas japonesas e os deuses principais Amaterasu Omikami (deusa do sol), Tsukuyomi no Mikoto (deus da lua), e Susano no Mikoto (deus das tempestades). Acredita-se que o tataraneto de Amaterasu Omikami foi o imperador Jimmu, o lendário primeiro soberano do Japão.

A ausência de escritos sagrados no Xintoísmo reflete na falta de mandamentos morais religiosos. Em contrapartida, o Xintoísmo enfatiza a pureza no ritual e a purificação daqueles que lidam com os kami.

Budismo

Originário na Índia por volta do século V a.C., o Budismo se espalhou pela China nos séculos II e III d.C., e finalmente chegou ao Japão via Coréia no século VI, quando o rei de Paekche enviou uma estátua do Buda e cópias das suras ao imperador japonês. O Budismo se espalhou rapidamente entre as classes altas por causa da influência da família pró-budista Soga em sua luta contra as facções anti-budistas. O príncipe Shotoku (574-622), que deu apoio imperial à construção de templos como o Horyuji (atualmente na província de Nara), é considerado o fundador do Budismo no Japão.

O imperador Shomu (701-756) adotou o Budismo como religião oficial do Estado e construiu o templo Todaiji em Nara e sua grande estátua do Buda. Entretanto, a coexistência do Budismo com o Xintoísmo continuou. Responsável por promover rituais que promoviam o bem-estar nacional, as seis seitas Nara, que dominavam o Budismo naquele tempo, eram primeiramente acadêmicas e tinham pouca influência sobre a população em geral. No início do período Heian (774-1185), a seita Tendai foi introduzida no Japão pelo sacerdote Saicho (767-822) e a seita Shingon foi introduzida por Kukai (774-835), o qual é também conhecido como Kobo Daishi. Essas duas seitas esotéricas vieram a ser as mais importantes seitas na corte imperial.

No período Kamakura (1185-1333), dois grandes acontecimentos ocorreram no Budismo no Japão. O primeiro foi o estabelecimento da escola Zen por Eisai (1141-1215), fundador da seita Rinzai, e posteriormente modificada por Dogen (1200-1253), fundador da seita Soto. O Zen encontrou um público receptivo na elite guerreira de seu tempo devido à sua praticidade e ênfase na autodisciplina e meditação. A prática Zen utiliza a meditação sentada, conhecida como zazen, enigmas conhecidos como koan, como meios para se alcançar a iluminação (satori). A principal diferença entre as duas seitas é que os locais Rinzai Zen são muito mais importantes para a prática koan que no Soto Zen.

O segundo acontecimento importante foi o rápido crescimento das seitas do Budismo popular entre as pessoas comuns. Isso inclui as seitas da Terra Pura, que ensinam que o canto do nome do Buda Amida é o melhor caminho para receber um renascimento no Paraíso de Amida, e também a seita Nichiren, que enfatiza o canto da Sura de Lotus.

No período Edo (1600-1868), o xogunato Tokugawa solicitou que todas as pessoas fossem filiadas a um templo Budista como parte do seu esforço de manter a população longe do Cristianismo. Essa medida assegurou uma grande base de membros nos templos, porém não contribuiu para a vitalidade do Budismo como uma religião viva. No princípio do período Meiji (1868-1912), esse sistema entrou em colapso por meio de ondas de sentimento anti-budismo estimuladas pelo desejo do governo de eliminar a influência do Budismo dos santuários Xintoístas e fazer do Xintoísmo a religião oficial do Estado. Como resposta a isso e à mudança do ambiente social da era moderna, o Budismo passou a se esforçar para redefinir o seu papel no Japão.

Culto Memorial BudistaCulto memorial Budista
A cerimônia Budista contempla a oração pelo repouso das almas

Cristianismo

O Cristianismo no Japão pode ser claramente dividido em três períodos: o encontro inicial com o Cristianismo, que começou no século XVI; a reintrodução do Cristianismo, depois de mais de 200 anos de isolamento nacional finalizado no século XIX; e o período logo após a II Guerra Mundial.

Introdução e Perseguição

O missionário jesuíta Francis Xavier desembarcou em Kagoshima em agosto de 1549. As atividades do missionário jesuíta estavam centradas no Kyushu, a parte mais ao sul das quatro ilhas principais japonesas e, por volta do ano 1579, seis daimyo (senhores militares regionais) tinham sido convertidos e havia aproximadamente 100 mil cristãos. Os esforços dos jesuítas foram tratados em princípio com benevolência pelo líder militar Oda Nobunaga e inicialmente pelo comandante militar Toyotomi Hideyoshi. Provavelmente em reação a sua crescente influência em Kyushu, entretanto, Hideyoshi posteriormente se voltou contra o Cristianismo, crucificando 26 cristãos em Nagazaki em 1597. Após ele se tornar de fato o mandante no Japão, em 1600, Tokugawa inicialmente tolerou os missionários, mas, em 1614, o governo de Tokugawa proibiu o Cristianismo e expulsou os missionários do Japão. Naquele momento existiam mais de 300 mil cristãos japoneses. É estimado que aproximadamente 3 mil tenham sido executados, e um grande número renunciou a sua fé com o resultado das perseguições. Muitos outros conciliaram suas crenças mantendo sua fé em segredo.

Reintrodução

Após o Japão ter abandonado a sua política de isolamento, os missionários estrangeiros voltaram em 1859, embora eles não fossem permitidos evangelizar abertamente até 1873. Durante esse período mais de 30 mil cristãos ‘ocultos’ se declararam abertamente; eles pertenciam a grupos que se reuniam para reuniões clandestinas durante mais de 200 anos de perseguição.
Missionários católicos e protestantes passaram a ser mais ativos a partir dessa época e, embora o número de convertidos tenha sido relativamente pequeno, os cristãos influenciaram na educação e no movimento de união comercial. O crescimento do nacionalismo e a promoção da afiliação aos templos Xintoístas como dever patriótico fizeram que os anos de 1930 fossem difíceis para muitos cristãos.

Após a II Guerra Mundial

As atividades cristãs logo após o período pós-guerra teve o auxílio das autoridades da ocupação, mas pequenos avanços foram observados. Em 2006, os cristãos somavam 3,03 milhões de pessoas, o que representa menos de 2,4 % da população.
Apesar da crescente popularidade das cerimônias de casamento no estilo cristão, o Cristianismo no Japão é ainda considerado por muitos japoneses como religião de estrangeiros. Como o conhecimento e interesse pelo Cristianismo têm crescido nos últimos anos as pessoas certamente estão um pouco mais familiarizadas com a religião. Essa familiaridade, entretanto, não foi traduzida em um aumento no número de adeptos. Uma razão possível para esse baixo crescimento é que a ênfase na crença exclusiva no Deus cristão requer um forte compromisso em renunciar ao politeísmo mais brando do Xintoísmo e do Budismo japonês.

Religião no Japão Hoje
Principais Correntes do Xintoísmo e do Budismo

A urbanização afastou muitos japoneses dos seus laços familiares com templos específicos do Budismo e do Xintoísmo. Ainda assim, muitas pessoas se consideram tanto xintoístas como budistas.

Sacerdote Budista em Treinamento Asceta
Sacerdote budista em um treinamento asceta
Um sacerdote com seu chapéu de palha assentado em meditação e oração pelas almas
(Foto cortesia da AFLO)

A estatística da Agência de Assuntos Culturais para 2011 mostra a membresia combinada de ambas as religiões em 187,4 milhões, cerca de 53% a mais do que o total da população do Japão. No sentimento religioso da maioria dos japoneses o Xintoísmo e o Budismo podem coexistir pacificamente sem conflito. Para uma pessoa comum, entretanto, a filiação religiosa não se traduz em uma frequência regular aos cultos. A maioria das pessoas visita os santuários e templos como parte dos eventos anuais e rituais de passagem mais marcantes.

Esses eventos anuais incluem os festivais do santuário e do templo, a primeira visita ao templo ou ao santuário do ano (hatsumode), e a visita ao túmulo da família durante o Festival Bom. Rituais comemorando os estágios da vida das pessoas incluem a primeira visita a um santuário pelo recém-nascido (miyamairi), o Festival do Santuário Shichi-go-san para os meninos de três e cinco anos e para as meninas de três e sete anos, a cerimônia de casamento Xintoísta, e o funeral budista.

Novas Religiões

O desenvolvimento mais notável da religião no Japão no século XX foi o rápido crescimento de novas religiões. Os ensinamentos dessas novas religiões se alinharam com uma ampla gama de tradições prévias, incluindo aspectos do Shito, Budismo, Confucionismo, Taoísmo religiões populares e Xamanismo. Os fundadores das novas religiões são geralmente reverenciados como deidades vivas (ikigami).

Uma das atrações das novas religiões para muitos é o senso de comunidade que elas dão às pessoas que perderam o apoio mental e espiritual que historicamente era dado pelos familiares, comunidade local ou pelas religiões tradicionais.

Kamidana
Kamidana
Um santuário em miniatura para adoração das divindades no lar

Os aspectos perigosos que o forte controle das novas religiões exerce sobre seus fiéis têm estado sob maior vigilância após o ataque com gás sarin no metrô de Tóquio em março de 1995. O atentado matou 12 pessoas e feriu mais de 100. Esse ataque foi realizado pelo grupo religioso Aum Shinrikyo.

Instituições Religiosas no Japão

 

 Xintoísmo

 Budismo

 Cristianismo

 Outras

Santuários, templos, igrejas, outras organizações

88.591

85.439

9.344

38.107

Religiosos (sacerdotes, ministros, etc.)

76.190

348.662

35.129

216.560

Membros

102.756.326

84.652.539

2.773.096

9.435.317

Nota: Essa estatística está baseada em informações fornecidas pelas várias organizações religiosas. Elas podem alterar com o passar dos anos
Fonte: Agência de Assuntos Culturais, julho de 2012



Texto originalmente disponível em: https://www.br.emb-japan.go.jp/cultura/religiao.html

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